Tornei a escrever o artigo, pela terceira vez. Desta feita, ficou bem. Só no final: («Encontramo-nos, por consequência, diante dum terrível problema para o destino da sociedade.
Resolvê-lo-emos?») - ele teve que dizer.
- Não será demasiado dubitativo? - perguntou. - Acha que não vai tirar um pouco as esperanças?
A coisa mais simples a fazer era tirar o ponto de interrogação: «
Resolvê-lo-emos!».
Assim, com exclamação. Uma segurança calma.- Mas não lhe parece que fica demasiado contemporizador? Dá a impressão de ser uma coisa de vulgar administração.
Assentou-se em
repetir a frase, uma das vezes com interrogação e outra sem ela: «
Resolvê-lo-emos? Resolvê-lo-emos!».
Mas não seria remeter a solução para um futuro indeterminado? Experimentámos colocar a frase no
indicativo: «
Resolvemo-lo? Resolvemo-lo!». Mas não soava bem.
Sabe-se como estas coisas são;
começa-se por mudar uma vírgula e depois torna-se necessário mudar uma palavra, por fim a construção duma frase, e acaba por se perder tudo. Discutimos meia hora. Finalmente,
propus que pergunta e resposta fossem em tempos diferentes. «
Resolvê-lo-emos? Estamos a resolvê-lo!». O presidente mostrou-se entusiasmado e, a partir desse dia, a sua confiança nos meus dotes aumentou.
Italo Calvino, em "A vida difícil"
(A tradução, de 1962, é má, mas é o que tenho lá em casa.)
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